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Coronavírus, a experiência de uma jovem enfermeira italiana

 
20 março 2020   |   , Coronavirus,
 

Este é o testemunho de Chiara Muffato, enfermeira em Mestre, Veneza, que há semanas está em uma área de alta disseminação do Coronavírus.

Desde quarta-feira, 11 de março, toda a Itália está em quarentena devido à epidemia de Coronavírus. Até o momento, existem “x” casos e “y” mortes. O primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, assinou um DPCM (Decreto Presidencial do Conselho de Ministros) para conter e gerenciar a emergência do COVID-19 em todo o território nacional. «Estou prestes a assinar uma medida que eu poderia definir assim: – ele anunciou – #euficoemcasa. Não haverá mais “zona vermelha” ou “zona 1 e zona 2”, haverá apenas a zona protegida da Itália. Portanto, devem ser evitados deslocamentos em todo o território nacional, a menos que sejam motivados por razões de trabalho, necessidade ou saúde. […] também acrescentamos a proibição de agrupamentos ao ar livre e em espaços fechados».

Chiara Muffato mora em Noale, na cidade metropolitana de Veneza, no Vêneto; ela tem 28 anos e é enfermeira no departamento de Hematologia do Hospital do Ângelo, em Mestre. Uma área oficialmente declarada zona vermelha desde domingo, 8 de março, mas onde a situação já estava comprometida há muito tempo.

Alguns dias atrás, Chiara escreveu para suas amigas: «Durante um turno, eu tive um paciente suspeito positivo, por isso tivemos que usar todo o equipamento de proteção. E ali eu senti o desconforto dos meus colegas, médicos e enfermeiros, ao usar este KIT que não deixa respirar direito, dentro do qual se transpira muito… E eu o usei por apenas algumas horas! A partir dessa experiência, surgiu em mim a exigência de informar muitas pessoas sobre o que eles estão fazendo».

Segundo Chiara, é importante que o mundo inteiro conheça a situação, «não tanto para criar alarmismo, mas para criar conscientização. Eu, como profissional de saúde, estou tentando fazer a minha parte, com as informações corretas. No trabalho, estou blindada no setor, mas até agora não tivemos casos. No hospital, no entanto, nos outros setores, existem casos, e sei que é difícil porque estão faltando leitos e forças», diz Chiara.

Dar o melhor de si, para além do medo

Nestes tempos, a condição de quem trabalha na área da saúde é pesada, até psicologicamente. Chiara explica: «Ser obrigado a ir ao local de trabalho é mentalmente difícil, primeiramente porque tenho consciência de estar continuamente em risco de contágio e depois porque tenho medo de, da minha parte, ser um veículo de contágio para aqueles que estão perto de mim: meu namorado, minha família, meus avós».

Então, onde encontrar forças? «Em saber que não estou fazendo algo como um fim em si mesmo, mas que isso ajuda o irmão. Posso dar conforto, posso dar a informação correta. Posso apoiar, dentro e fora da realidade do hospital», explica Chiara.

O melhor e o pior de uma sociedade

Nesse contexto, segundo Chiara, ficam mais evidentes as belezas e as fraquezas de uma sociedade, de um povo, de um país. Por um lado, existem «aqueles que ficam em casa e tentam transmitir a mensagem correta; e aqueles que, ao invés, não se importam com nada nem com ninguém. Há aqueles que dão o melhor de si para ajudar os que estão em dificuldade, para as despesas básicas ou serviços de primeira necessidade, e aqueles que se preocupam apenas porque não poderão ir tomar um aperitivo, como costumam fazer toda sexta-feira».

Chiara observa ainda que, por outro lado, no trabalho, «a união faz a força, e tentamos trabalhar em equipe, tanto na emergência quanto em situações não emergenciais. Somente dessa maneira o resultado será o melhor para a pessoa assistida, e o trabalho será dividido sem sobrecarregar apenas uma pessoa. Para nós, física e mentalmente, o trabalho em equipe é necessário».

Na linha de frente durante uma pandemia

«Quando decidi ser enfermeira, estava consciente de que situações de emergência poderiam estar na agenda, mas nunca imaginei que poderia me encontrar numa situação como essa. No trabalho, a emergência sempre pode acontecer, mas é limitada ao hospital, à enfermaria, àquele determinado paciente, àquele momento específico. No entanto, a situação criada hoje é uma emergência onipresente. Paradoxalmente, eu me sinto mais segura no trabalho, no setor em que me encontro, podendo tomar todas as precauções em relação à quando estou em casa».

Nesta situação, explica Chiara, é importante seguir as diretrizes do governo e tentar ver o que está acontecendo a partir de outra perspectiva. «Creio que ajudaria ver este período não como um período de reclusão ou privação, mas como um período que nos permite parar e refletir, o que nos ajuda a ver o outro com um olhar diferente. A sociedade do EU agora está descobrindo que o senso cívico, o bem comum, existe apenas se houver um NÓS. Ficar em casa, ter cuidado, privar-se de beijos e abraços… é preciso ver isso com novos olhos. E essa situação, essa emergência, é uma chance de redescobrir-se e redescobrir».

E ela conclui: «Espero que essa situação ajude a nos unir mais, a entender que o indivíduo “é” se houver também o próximo. Temos que olhar além do nosso nariz, porque, se continuarmos vivendo como pessoas egoístas, dando mais importância ao “eu” do que ao “nós”, não teremos saída».


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