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“A TV2000 escuta e narra sem fazer barulho, buscando lançar luz” – Entrevista com Gennaro Ferrara

Em um mundo midiático em transformação, Gennaro Ferrara defende o valor de uma TV que informe, com significado e humanidade.
Gennaro Ferrara trabalha há 24 anos como jornalista, autor e apresentador de televisão, para a TV2000: a emissora da Conferência Episcopal Italiana. Entre diversos programas, ele apresentou “O Diário de Papa Francisco” e “As Palavras de Fé”. Atualmente, ele está no ar com “Igreja Viva”, sobre o papado de Leão 14, o Jubileu e o caminho sinodal. Nós nos encontramos com ele para refletir sobre mídia e comunicação em um momento complexo como o que estamos vivendo, com a televisão envolvida em um processo de mudança, entre a televisão tradicional, as plataformas e o streaming.
Gennaro, o que é positivamente exclusivo da televisão aberta?
Não há dúvida de que estamos em uma fase de mudança e é difícil imaginar um ponto de chegada. Até o momento, o principal elemento positivo que a TV aberta retém, a meu ver, é a capacidade de oferecer uma proposta global, baseada na relação de confiança com o telespectador e continuar a oferecer uma visão mais ampla da realidade. Explico: o uso de conteúdo que ocorre por meio da web é uma proposta feita sob medida para o indivíduo. A TV aberta, por outro lado, é dirigida, por definição, a um grupo mais amplo. Não fala das necessidades do indivíduo, mas de uma comunidade. Desse modo, não só oferece uma visão mais ampla do contexto cultural, mas, em certo sentido, contribui para a criação dele.
Nesse dinamismo contínuo, quais são os pontos fixos, as principais características, os objetivos e os desafios da TV2000?
A proposta da TV2000 é muito orgânica, com um olhar de orientação cristã que abarca toda a programação. Um fio condutor une informação, entretenimento e debates: um espírito unitário que deriva de uma leitura cristã da sociedade, mas que nunca cai em propaganda ou meras batalhas ideológicas. Nosso estilo é criar espaços reais de diálogo, respeitando as pessoas, especialmente quando elas são objeto de uma narração. Os programas da TV2000 são espaços de uma análise aprofundada surpreendente. Mesmo quando apresentam cinema e teatro, pessoas famosas, trazem à tona uma essência e uma profundidade particulares, diferentes do habitual. A TV2000 sabe escutar e narrar de forma profunda, sem fazer barulho, mas buscando lançar luz.
Há algum tempo, também faz isso por meio da plataforma Play2000.it
A TV2000 está assumindo o desafio da mudança também com esse projeto, totalmente operacional, do qual nos orgulhamos. Não se trata simplesmente de dar acesso ao nosso conteúdo pela web, mas de reformulá-lo com outra linguagem e propor novos produtos pensados exclusivamente para o espaço Play2000.it.

(Boa) parte da TV apoia a espetacularização da dor, do medo e do mal. O quanto é importante que a televisão transmita confiança, fale de esperança e do que há de positivo no mundo?
Não quero julgar os outros ou fazer discursos moralistas. Falar do bem não deve resultar na exposição de uma realidade inexistente. Acredito que o esforço de todos – certamente é o da TV2000 – deve ser o de falar da realidade, o que significa falar sobre o bem e o mal. Ao contar, no entanto, não há apenas o objeto, mas também o modo. Desse ponto de vista, devemos fugir do perigo da simplificação. Porque podemos também falar muito mal sobre o bem. Por exemplo, com ênfase em contos de fadas.
Até o mal deve ser dito, você falou…
Com o objetivo de contribuir para a formação de uma cultura não muscular, como disse Papa Leão 14 ao se encontrar com jornalistas no dia seguinte à sua eleição. Precisamos de uma comunicação que não induza a torcer por um lado ou por outro, mas que ajude a entender a realidade e o ponto de vista do outro. Papa Leão falou de uma comunicação capaz de escutar. Creio que esse é um desafio para todos e é a linha seguida de forma decisiva pela TV2000: escutar e transmitir uma realidade, tornando-a uma oportunidade de diálogo e intercâmbio, não de partidarismo. Dividir o mundo entre bons e maus é uma tentação que provavelmente atrai ouvintes, mas não ajuda na compreensão. A própria cultura da paz deve basear-se na justiça e na verdade.
Em uma época como a nossa, em que toda a comunicação está mudando, o jornalista é fiador do quê? Como ele difere de outros comunicadores?
O jornalista é quem garante a veracidade do que está contando. Somos invadidos por uma quantidade de notícias como nunca aconteceu, mas dentro delas existem fake news falss e informações que não são falsas, mas que são construídas de forma sugestiva, direcionadas segundo o nosso perfil, para favorecer instintos e preconceitos. O jornalista precisa certificar-se, verificar uma notícia e, ao mesmo tempo, ao contá-la, oferecer um ponto de vista plural sobre ela. É tarefa do jornalista ampliar a visão de seu interlocutor.

Para o jornalista, em um contexto histórico e geopolítico tão delicado, resta apenas (por assim dizer) a tarefa de contar a realidade, ou também a possibilidade de alimentar conceitos fundamentais como paz, fraternidade e humanidade?
Não se pode separar os valores da realidade. Para um jornalista, os valores devem ser contados quando são fatos, não meros princípios. O esforço é, então, saber compreendê-los e contá-los. Vou dar um exemplo: Papa Leão 14 viveu a temporada de Covid no Peru, como bispo de Chiclayo. E lá foi particularmente difícil, com um mercado negro de oxigênio vendido a preços extremamente altos, inacessível para muitas pessoas que morreram de Covid. Ele conseguiu, em muito pouco tempo, organizar uma coleta para construir aparelhos que fabricavam oxigênio e passou a distribuí-lo gratuitamente nas ruas de Chiclayo. Falando das mortes por Covid no Peru, um jornalista tem o dever de contar essa história: verdadeira, importante, valiosa porque salvou vidas. É uma história que importa tanto quanto a do mercado negro de oxigênio no Peru e do número de mortes por Covid. Falar sobre isso significa contar o fato de modo completo. E no mundo inteiro há motivos para esperança.
Também se aplica à guerra?
Na trágica crônica da guerra, ao lado dos bombardeios e das crianças morrendo de fome em Gaza, da história de uma política internacional que voltou à lei do mais forte, além da ênfase ao espaço que é dado às palavras dos poderosos (que também devem ser contadas), deve-se oferecer um serviço que não simplifique entre o bem e o mal, que recupere uma visão multilateral e internacionalista dos fatos, que relembre o valor da paz e que também dê voz aos povos que a desejam. Não apenas aos senhores da guerra.
A própria televisão é composta de diferentes áreas: notícias e entretenimento, documentários e debates. Pequenas partes de um único corpo. Talvez o denominador comum sejam as histórias que são escolhidas para serem contadas. Os testemunhos a serem oferecidos ao espectador. Qual é a importância das boas histórias? Qual é a importância de procurar as certas?
Isso é decisivo, mesmo que apenas por um mero discurso de sobrevivência: quanto mais bonita e interessante é a história, mais ela é vista pelas pessoas. Mas o importante para mim, trabalhando em uma talk diário, é encontrar pessoas cujas vidas coincidam com a história que está sendo contada. Muitos são capazes de contar histórias, mas os que são capazes de vivê-las são mais raras. O público não deve ser enganado. Pessoas com experiência de vida devem ser encontradas.

Não é por acaso que o bordão da TV2000 é “Autêntica por vocação”
Estou na TV2000 há mais de vinte anos e encontrei um espaço de liberdade expressivo, que não vejo com muita frequência. A autenticidade está nisto: mesmo com uma identidade cultural muito precisa, porque a TV2000 tem uma identidade cultural e uma programação muito precisas, nada é desenvolvido de forma simplista. Se nós, e eu no programa atual “Igreja Viva”, focássemos apenas nos aspectos devocionais e comemorativos, não seríamos autênticos. Estaríamos fazendo propaganda para a Igreja, acabando por fazer um péssimo serviço. A ideia é, ao invés, tentar colocar os valores e a fé à prova da vida. Queremos tentar crescer com os nossos telespectadores. Não é fácil. Pessoalmente, encontro muita diferença entre os hóspedes que transmitem algo vivo e aqueles que transmitem algo teórico. A autenticidade é a narração da vida, não das ideias abstratas, nem mesmo de uma doutrina religiosa.
A palavra “responsabilidade” também vem à mente, diante do poder da TV na formação das massas. Qual é a importância dessa palavra para quem faz esse trabalho?
A responsabilidade é um tema muito importante, central, que pertence a todos. Devemos ter grande responsabilidade nas palavras que pronunciamos. Papa Leão 14, no encontro com os jornalistas, citando papa Francisco, falava de desarmar a comunicação. Pesar, escolher as palavras. Papa Francisco dizia que é possível matar com as palavras. É preciso ter um rigor absoluto na escolha das palavras, que criam linguagem e cultura. Inclusive aquelas que escrevemos em nossas redes sociais. Ser jornalista na TV2000, nesse sentido, é uma escola, cujo ensinamento procuramos trazer para a nossa vida.
Uma última pergunta sobre os jovens. Que relação eles têm com a TV? Quão difícil e importante é interceptá-los? Qual é a abordagem da TV2000 com eles?
Parece-me que hoje os jovens veem TV apenas indiretamente. A TV2000, aos sábados à noite, oferece filmes para as famílias, para tentar unir pais e filhos, dando-lhes a possibilidade de se emocionarem e refletirem juntos. Eu acho que é importante. De forma mais geral, tentamos realmente dar voz aos jovens, não de modo ideal, mas real. É o que procuraremos fazer durante o Jubileu dedicado a eles. Depois, é claro, a relação entre os jovens e a TV faz parte daquele grande ponto de interrogação de que estávamos falando no início. Embora seja preciso dizer que, no passado, já celebramos funerais de meios de comunicação que, depois, sobreviveram. É isso.



